Pensar nem sempre é estar doente dos olhos

O maravilhoso heterônimo de Fernando Pessoa, Alberto Caeiro, diz em um dos poemas que amamos que " pensar é estar doente dos olhos", porque ele quer que seus leitores se ponham a sentir o mundo. Mas, como hoje poucas pessoas fazem qualquer uma das duas coisas ( pensar e sentir), permitimo-nos dizer que sentir é fundamental, mas pensar também. Exercite essas duas capacidades: leia mais, viaje mais, converse mais com gente interessante, gaste seu tempo discutindo ideias e não pessoas.

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Vamos polemizar um pouco, pois isso ajuda a aprender a pensar!

Esse blog anda muito calmo, por isso escrevi um artigo para acirrar um pouco os ânimos. Leiam e emitam suas opiniões, só por favor não tomem como críticas pessoiais: são exercícos de pensamento necessários em um mundo tão cheio de gente que só repete o que ouve ou vê.
                              
                            OS DEMÔNIOS DA AREZZO — Giovana Marques Fontes

O recente repúdio de consumidores exaltados à nova coleção Pelemania, da Arezzo, fabricada com tiras de peles de animais “exóticos” ( raposas e coelhos) me faz crer que o mundo, definitivamente, tornou-se um lugar muito chato com a politicamentecorretomania. Ecoam por todos os lados vozes muito indignadas, apregoando maldições contra a morte de animais para a fabricação de calçados e acessórios. Porém, parece-me que muitos dos reclamantes sequer pensaram com o devido carinho se eles próprios colocam em prática aquilo que pregam.


Eu nem ao menos vi a coleção( que já foi retirada das lojas da Arezzo), só fiquei sabendo das manifestações pela internet, mesmo assim me ressenti pela marca, não porque seja uma consumidora assídua, mas porque detesto pessoas inflamadas discutindo questões sem argumentos plausíveis. É óbvio que eu não sou contrária a manifestações de defesa dos animais, o que sou contra é a hipocrisia, a discursos vazios.

Muitos dos consumidores que sugeriram “ arrancar a pele dos donos da Arezzo para fabricar sapatos” certamente utilizam caçados feitos de couro de boi, de avestruz( chiquérrimo e caríssimo), de peixe...então, vejamos: pelo brilhante raciocínio desses indivíduos matar boi pode, porque tem muito, mas coelho é bonitinho, logo é crime. Ora, Aristóteles estaria se revirando no túmulo se acompanhasse uma lógica tão estapafúrdia. Se não querem peles nas coleções, porque não querem vítimas inocentes, senhores e senhoras, passem a usar calçados feitos de pano e fabricados por pessoas que ganham salários honestos. Sim, afinal nossos tênis de couro da Nike, além de requererem a morte dos bois para a sua produção ainda são feitos em países como a China em fábricas que se utilizam de mão de obra semiescrava, mas isso está certo, não é?

E tem mais: querem uma boa causa para brigar de verdade? Então parem de consumir as baratíssimas roupas fabricadas no Brás e no Bom Retiro, em São Paulo, à custa da escravidão de bolivianos clandestinos. Lutem contra a máfia coreana que infesta a 25 de março e aproveitem e parem de consumir produtos falsificados e cds piratas vendidos no mesmo local. Façam o mesmo em relação a produtos sem nota vindos do Paraguai, ou sonegar imposto impedindo que o dinheiro seja aplicado em escolas e educação e melhor do que usar peles animais? E por favor me poupem do aforismo casuísta: mas é que imposto não vai mesmo para o fim devido porque os políticos roubam. Então sejamos mais espertos ao votar em alguém. Um erro nunca deve justificar o outro!

Por fim, reafirmo: acredito nos direitos dos animais, contudo só aceito esse discurso radical de punição contra a Arezzo vindo de pessoas que realmente creem na causa. Acharia muito aceitável que um vegetariano participante de ONGs de defesa dos animais tivesse esse repúdio à coleção da marca. Já quanto aos muitos internautas que li falando do caso, creio que não passa de puro sensacionalismo internético. Gente que descobriu a liberdade de expressão e pensa que é a versão moderna de São Francisco de Assis, não expulsando os demônios da cidade de Arezzo, na Itália, mas expulsando os demônios da Arezzo. Infelizmente, boa parte dessas pessoas escolhe se expressar emitindo opiniões infundadas e/ou hipócritas. Se precisam de alívio de consciência seria melhor fazer terapia e, em tempo, lembrarem-se do célebre conselho de Nelson Rodrigues: “ Toda unanimidade é burra.”

3 comentários:

  1. Para variar, as pessoas decidem preservar "por ordem de fofura". É ingênuo classificar vestimenta como futilidade e jogar no lixo as possibilidades várias de adorno que a natureza nos permite. Bom post, Gio!

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  2. Minha irmã tem uma amiga que se diz vegetariana. Não entendendo quase nada do assunto mas durante uma refeição que a vi comendo frutos do mar, perguntei qual o critério que ela usava. Ela respondeu justamente isso. Só não como os bichinhos que acho bonitos. Eu fiz: Hã?!?

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  3. Belíssima crítica, Giovana! Parece-me que foi banalizado um cuidado especial ou um carinho hipócrita por espécies de animais exóticas ou à beira da extinção. Sou vegetariano convicto e, há dois anos, não utilizo nem como produtos de origem animal. Foi uma opção totalmente pessoal e, sobretudo, distinta desses que escolhem uma seleta gama de animais para proteger, como cachorros e gatos. O blog está excelente! Há algum tempo não o visitava. Abraços!

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